quarta-feira, maio 21, 2008

Porque é que a galinha atravessa a rua…


Quase toda a gente conhece a anedota acerca do motivo pelo qual uma galinha atravessa a rua, acabando-se surpreendentemente por justificar apenas com o desejo de a galinha querer passar para o outro lado.

É conhecida a habilidade de muitas personalidades para o aproveitamento de situações que por si só, muitas vezes pouco significado têm, mas que acabam por servir de motes de afirmações a gosto e uso pessoal, quase sempre duvidoso.

Imaginemos nessa situação os comentários de algumas personagens conhecidas:

José Sócrates: O facto das galinhas poderem atravessar a rua, foi mais um dos objectivos alcançados por este governo, que nisso se empenhou arduamente com a colocação de passadeiras em todas as ruas.

Correia de Campos: A galinha atravessou a rua para ir pôr o ovo numa maternidade em Badajoz após termos fechado a maternidade local, de acordo com o plano nacional de saúde.

Cavaco Silva: O Estado português deve ter sempre em conta a necessidade de todas as galinhas em atravessar a rua, facto a que o presidente da república deve estar sempre atento.

Mário Soares: O facto de uma galinha atravessar a rua, mostra bem a importância de qualquer estado democrático no processo da economia da sociedade. Eu sempre fui a favor das galinhas. Estive até para fazer uma presidência aberta na capoeira lá de casa.

Durão Barroso: Com o novo enquadramento europeu, eu diria até que, qualquer galinha europeia deverá poder atravessar todas as estradas no Parlamento Europeu.

Santana Lopes: Desde sempre que o PPD/PSD se bate pelas galinhas e pelo direito a atravessar a rua. Já Sá Carneiro acreditava um dia poderem vir a voar.

Alberto João Jardim: Essa coisa de as galinhas atravessarem a rua é mais uma forma desses senhores do continente desconsiderarem as galinhas da Madeira, que com o infame corte orçamental dos políticos de Lisboa, tiveram de cortar as pontas das penas para não cairem ao mar.

Manuel Alegre: Pergunto ao vento que passa, notícias da minha galinha e o vento cala a desgraça e é grande pena a minha, porque a mim ninguém me cala e a minha galinha será sempre livre de atravessar a rua.

Francisco Louçã: Este governo tem estado a oprimir as galinhas, que cada vez mais se vêm obrigadas a atravessar a rua, num protesto claro contra as medidas governamentais.

Miguel Portas: A evolução da sociedade, mostra que cada vez mais galinhas atravessam a rua, face à exigência de um mercado que lhes exige mais das penas.

Paulo Portas: Há muito tempo que o CDS/PP tem vindo a alertar para o facto das galinhas atravessarem a rua e disso tem feito mote da sua intervenção pública e no parlamento, com carácter de urgência. Eu gosto mesmo é de galos.

Luis Filipe Menezes: Eu espero que a galinha não tenha atravessado a rua para se candidatar à liderança do PSD.

Manuela Ferreira Leite: Já era tempo de uma galinha atravessar a rua para pôr o partido na ordem.

Marcelo Rebelo de Sousa: A galinha que atravessa a rua, merece à partida uma nota 10, aliás, recomendo vivamente um livro que agora saiu e que se chama " como pôr a galinha a atravessar a rua".

Jerónimo de Sousa: Uma galinha atravessar a rua, retrata bem como a sociedade capitalista explora os galináceos durante as 40 horas semanais, pelas quais nos temos batido numa luta constante e activa.

Odete Santos: A galinha mostra a importância do poder galináceo, quando atravessa a rua num esforço que a sociedade capitalista explora e que o governo não tem dado importância.

Álvaro Cunhal: A galinha atravessou a rua ?! Olhe que não!

Cardeal José Policarpo: A galinha atravessa a estrada com fé e devoção, para se entregar na cristandade do sacrifício, morrendo sem o pecado original.

Sigmund Freud: O acto da galinha atravessar a rua, mostra bem como isso reflecte a sexualidade da galinha face ao subconsciente.

Albert Einstein: Se a galinha atravessasse a rua a uma velocidade próxima da luz, a energia das penas seria igual à sua massa a multiplicar pelo quadrado da velocidade. O problema é os ovos sairem cozidos.

Galileu Galilei: Não é a galinha que atravessa a rua, mas a rua que se deixa atravessar pela galinha, mas não digam nada à Santa Inquisição senão quem se frita sou eu.

Isaac Newton: Se a galinha atravessar a rua e não voar, é porque está sujeita à mesma força da gravidade que faz o ovo cair no chão.

Charles Darwin: Desde a época dos dinossauros que as galinhas têm vindo a evoluir para atravessarem a rua.

Papa Bento XVI: A galinha quando atravessa a rua é abençoada quando acaba por ser comida pelos sacerdotes.

Ayatollah Khomeini: Todas as galinhas devem atravessar a rua de burka vestida para fazer a guerra santa contra os infiéis.

George Bush: Os EUA estarão sempre atentos a cada galinha que atravesse a rua e não tolerarão nenhuma actividade terrorista, mesmo que seja colocar um qualquer ovo que possa ameçar a segurança nacional.

Rainha Isabel II: A galinha que atravessa a rua, representa a real tradição britânica para ir tomar o chá das cinco.

Príncipe Carlos: Quando a galinha atravessar a rua, ou é a fugir da Camila ou vai jogar pólo como um dos meus filhos.

Margaret Thatcher: Não permitirei que as galinhas atravessem a rua para se juntarem à luta dos mineiros.

José Eduardo dos Santos: Os galinha pagou nos generale para atravissar nos strada´para eu ter os comissão para comprar os quinta nos Europa.

Sílvio Berlusconi: Assim que a galinha pagar à máfia, vai ter toda a protecção para atravessar qualquer estrada da Itália.

Bill Clinton: Quando uma galinha atravessa a rua é porque quer ir à sala oval da Casa Branca para ser assistente.

Osama Bin Laden: Todas as galinhas hão-de atravessar a rua para irem embater nas capoeiras dos americanos.

Pinto da Costa: Eu já disse que num teinho nada a ber cum essa galinha que atrabessou a rua na qual eu nunca estibe.

Major Valentim Loureiro: Não tenho conhecimento de nenhuma galinha a atravessar a rua e até um juiz desambargador me garantiu que isso não acontecia.

Carolina Salgado: É verdade sim, que várias vezes, uma galinha atravessava a rua para ir almoçar com o Sr. Pinto da Costa e com o Major Valentim Loureiro.

Dias da Cunha: A culpa é do sistema pelo facto da galinha ter atravessado a rua.

Luis Filipe Vieira: Eu tenho a certeza de que muitas galinhas ainda vão atravessar a rua para aderirem à campanha dos 300.000 sócios do Benfica.

Vale e Azevedo: Eu paguei do meu bolso e ainda espero que o Benfica me pague pela rua que a galinha atravessou.

José Mourinho: A galinha está em condições de aceitar o desafio e assim poder atravessar a rua. Eu mesmo também bati a asa e voei.

Cristiano Ronaldo: Qual galinha ? Quanto cobra ela para atravessar a rua ? Até podem vir 3 ou 4 e fazemos a festa da bicada em minha casa.

Luíz Felipe Scolari: Eu confio plenamente nas minha galinhas e se a galinha atravessou a rua, ôba, então é porque foi convocada, ora.

Carlos Cruz: Galinha ? A atravessar a rua ? Onde ? Não pode ser franga ou franganote ? Hummmm...

Herman José: Oi, uma galinha a atravessar a rua ? Será na marina de Vilamoura a caminho do meu barco ? És tão boa …

José Castelo Branco: Aiii, uma galinha a atravessar a rua! Que horror, ainda por cima poedeira! Que ar pindérico a bicha não ter uma pena sequer da Gucci. Será que também põe ovo? Hummmm….eu também queria pôr ovo, mas Chanel.

Maya: Com o Sol em Capricórnio e a Lua em Marte, prevejo que a galinha atravesse a rua no signo de Virgem, o que deve dar uma valente dor quando for pôr o ovo.

Jorge Palma: A galinha encostou-se a mim para atravessar a rua para irmos para o outro lado dar umas passas.

Nuno Eiró: Ai, uma galinha a atravessar a rua ? Ai eu adoro galinhas e galos. Olha a minha crista. Ai quem me alisa as penas, se eu atravessar também ?

Daniel Nascimento: A galinha atravessou a rua ? Ai, foi para receber um globo de ouro concerteza. Quem me dera ser galinha preta também.

Cláudio Ramos: Ai eu sei de certeza que a galinha atravessou a rua para fazer uma bicheza qualquer. Eu mesmo gosto de bichezas.

Elsa Raposo: Hummm…se a galinha atravessou a rua foi pelo galo da vizinha de certeza. Adoro capoeiras.

Lili Caneças: Acho muito bem que a galinha atravesse a rua, principalmente para fazer um peeling e ficar com as penas no ar, como eu.

Artur Albarran: Uma tragédia, um horror … a galinha atravessou a rua e as câmaras não estavam lá.

Baptista-Bastos: Eu pergunto-me onde estava a galinha no 25 de Abril quando ia a atravessar a rua ?

D. Duarte Pio: Eu e a minha Isabelinha temos um grande apreço pelas galinhas que atravessam a rua pela causa monárquica para ir brincar com o Afonsinho.

Belmiro de Azevedo: É evidente que a galinha atravessou a rua para ir a mais uma promoção dos nossos supermercados.

Manuela Moura Guedes: Foram cardos, foram rosas que fizeram a galinha atravessar a rua para encher a cloaca de botox para ficar como eu.

sexta-feira, maio 16, 2008

Pai... (16-5-1921 ... 11-12-2004)


A vida desenrola-se na aventura constante do desconhecido e os agrestes pinhais minhotos cedo dão lugar ao deslumbrar citadino dos prédios e avenidas da capital, no abrigo fraterno que a ocasião deu a conhecer.

Carros e motores traçam desígnios de labor, que o destino atraiçoou também, na perda de quem mais quis, mudando o compasso de um fado que se foi tocando baixinho entre copos de vinho e jogos de dominó.

No descanso resignado do tempo sem fim, uma voz inesperada rompe o silêncio que a vida contrariou mais uma vez, aumentando o fardo das obrigações, a que foi poupado no possível, pela recompensa das preocupações que se fizeram parcas.

O definhar fê-lo acontecer, no suporte dos malditos, qual expiação indesejada onde mão teve a morte que uma paz sofrida aceitou contrariada.

Fez-se assim, sepultura de um e de mais, que juntos lhes seria justo a partilha da sina.

Repouse então, lá no céu eternamente, na paz profunda que ora lhe deseja quem na falta o viu constante, numa casa que ora ficou vazia.

quarta-feira, maio 14, 2008

Pétalas de rosa


O acaso e a vontade juntaram-se à revelia na oportunidade, trocando-lhe as voltas nas tarefas que tinha pensado realizar naquele dia e assim, acabou por converter o desejo no mando que lhe iria traçar o caminho a percorrer.

Apressou o passo, buscando no fim do dia, o tempo necessário de chegar antes que se fechassem as portas da pastelaria que com o hábito se tornara num pequeno éden onde o chá preenchia o espaço convexo das chávenas, enquanto fatias do bolo de chocolate apaladavam conversas entre olhares nos encontros de fim de dia.

Com a mesma pressa entrou e saiu, já com o bolo de aniversário na mão, arrebatando um dos exemplares que davam fama à excelência da casa que os fazia desde que se lembrava, ainda na inocência da sua meninice, quando lá ia pela mão da sua Mãe.

O caminho fez-se agora próximo, directo à florista quase alí ao lado, na escolha das rosas que iria fazer oferecer, a que a sua própria saudade, em vão emprestava um vermelho rubro de sangue, tão vivo como a memória dos aniversários que iguais já celebrara antes, agora inscritos na emoção de os reviver, fazendo viver os outros.

Saiu correndo, tão depressa como a brisa faz desfraldar as velas de vontade e fez-se ao caminho, para que o destino final conhecesse a homenagem que uma Mãe que não a sua, iria receber daqueles que o coração guarda tatuados, numa alma acostumada a dar aos outros o que a vida lhe negara a miúde.

O bolo de aniversário cumpria a função, com a cumplicidade do aroma das rosas que pequenos borrifos de água e a pressa do caminho fizeram conservar na frescura da intenção da oferta e que agora repousavam numa jarra diante da janela, cujo parapeito parecia um pequeno altar aos que à distância, o pensamento aproximou.

Os dias passam-lhe ao sabor de um sorriso ligeiro, com que ia regando as rosas, que se iam abrindo num espreguiçar tingido pelos raios de sol que atravessavam a vidraça entreaberta, por onde sorrateira uma aragem leve entrara, tomando de caminho um rosário de pétalas, espalhando-as pelo chão, como se uma mão invisível traísse o acaso, para com elas formar as letras de um nome que ausente, lhe era familiar no aroma que continuava no ar, igual ao de um beijo de Mãe.

segunda-feira, maio 12, 2008

Diálogo com o silêncio …


Sentaram-se os dois à mesa do café, ele com um olhar sereno e um sorriso quase dissimulado, enquanto diante dele, ela assumia um olhar inquieto com as mãos finas sobre a mesa que se interpondo entre os dois, os apartava condescendente aos olhares que sobre ela se encontravam.

- Li o que escreveste e sinceramente não sei o que te dizer. Senti-me esmagada com as palavras. Ao ler aquele texto quase se consegue imaginar tudo o que se passou. Entendo que mais do que amor enorme, tinhas uma admiração profunda por ela, por tudo quanto ela passou durante toda a vida, que poucos poderão imaginar.

- Agora tudo faz parte dum passado, porque ainda ainda o transportas contigo, numa caminhada solitária ? Sei que foste perdendo todos os que te rodeavam, mas não estás só. Tens à tua volta pessoas que gostam de ti e sabes que gostam. Tens um coração enorme onde elas estão e de quem gostas profundamente.

- Quando é que vais conseguir libertar desse sofrimento que transportaste dos outros para ti mesmo ? Quando acabará essa herança que carregas só ?

Ele observava-a com os olhos, que algumas lágrimas dissimuladas a custo, conseguiam polir num brilho ondulado, ao sabor do mesmo sorriso com que chegou.
Saía-lhe pela boca o mesmo silêncio que ouvira tantas vezes na memória, como resposta às mesmas perguntas a que nem a alma nem o tempo haviam sabido ainda responder, num diálogo calado com a sorte.

domingo, maio 04, 2008

Dia de uma Mãe ... sem Ela


Nasceu no dia de Natal que lhe traçou o nome, não numa mangedoura, nem no conforto da palha, mas numa casa pobre e conheceu o desconforto e a escassez de meios que vitimaram cinco dos seus oito irmãos.

Marcou-a o destino com a pouca visão que aos sete anos lhe impôs o uso de óculos e a crença da época desaconselhou a instrução durante a segunda classe do ensino primário, que assim ficou incompleta, amputando o sonho de vir a ser professora da língua que tanto gostava e a reconhecida inteligência reclamaria para sempre, no desejo e no desgosto.

Gabavam-lhe a voz, que ainda jovem, emprestava ao fado que cantava, com a melancolia daquele que era também o seu, a que o pudor da época remeteu apenas para o canto caseiro, na companhia de um pai que no desgosto acalmado pelo álcool imitava o toque da guitarra com um velho abano enquanto a chamava de "Naninhas".

Viu a mãe sair de manhã para o trabalho, enquanto brincava com uma boneca improvisada por um trapo velho, entregue aos cuidados da irmã mais velha.

Cresceu, no sobressalto que a vida guardava diariamente com a cumplicidade do pai nas tabernas que lhe cobraram o soldo e as carreiras de bombeiro e a de sapateiro, a que substituíra a de soldado da Legião Portuguesa, por refutar fazer parte da polícia política, recusando fazer aos demais o que condenava que lhe fosse feito a ele.

A adolescência, entregou-a no trabalho, às vezes gratuito, no arranjo das peles e na feitura de tapetes de arraiolos, na pretensão de lhe servir de ofício para um futuro que nunca chegou.

Casou no recato do lar numa cerimónia discreta, não conhecendo o caminho do altar por um casamento que já lhe guardava nos maus tratos o quanto a vida pode ser agreste, quando o amor é pouco mais que um sonho para quem não chega a dormir para sonhar.

Sofreu a dor da surpresa de encontrar o pai enforcado na cozinha, após o ter ouvido trautear o fado da Mouraria, cuidando que o som do cair das molas da corda de estender da roupa no quintal, seria apenas uma denúncia de um qualquer acto inocente, próprio da esperada embriaguês.

Suportou de mãos postas em orações no quarto de dormir, o que a má língua constrói e destrói no lar, enquanto palavras e agressões dão vida à mentira e ao ciúme, acirrados nos conselhos e desaconselhos por um casamento que uma má família conjugal atormentava de maldade.

Subsistiu no silêncio e no desespero à tuberculose que levou ao internamento do marido durante nove meses e à entrega temporária da filha de cinco anos à irmã, para que assim a privasse do contágio que lhe poderia ser fatal.

Privou com a dor e o desespero supremos na vida, na fatalidade que no entanto lhe estava guardada ao ver falecer a filha atropelada em acidente de automóvel, quando esta ia acompanhada pela tia, após a ter visitado.

Viu sózinha, falecer-lhe nos braços o cunhado a quem prestou o derradeiro cuidado, ao som do pedido de desculpas pelo mal que outrora lhe causara, num arrependimento igual ao da sogra e mãe daquele, com o incómodo de quem nos devolve cuidado pela maldade enviada, quando os outros já os haviam abandonado.

Aceitara no cuidado maternal, a sobrinha que ficara órfã de pai, quando saindo da companhia da mãe a quem rejeitara aos treze anos, lhe batera à porta, para ser tratada como filha, até voltar a sair, casada, para mais tarde revelar a ingratidão durante as quatro décadas em que ignorou os que lhe quiseram como pais.
Viu-se apartada da justiça na morte da mãe que dedicada amara sempre, quando a honestidade não conheceu na irmã que com aquela vivia, nas justas das partilhas que os demais irmão e irmã lhe veriam nela.

Trocou-lhe a vida os passos, quando o anúncio de um mioma lhe ocultou uma gravidez que já não pode condenar, como o fizera a outras como esta, indesejadas, condenando-a a ter um filho que não queria e que um casamento não desejava.

Sofreu no corpo e na alma a dezena de operações a que a fraca saúde obrigara e lhe tomara a audição de um ouvido e um rim, anunciando-lhe a pouca vida esperada e o tormento da necessidade continuada dos cuidados médicos, que lhe salvariam repetidas vezes a vida, enquanto conhecia a realidade a que resignada se submetia à de uma tuberculose renal, o pûs que lhe invadira as entranhas, um coração que lhe fora perfurado na colocação de um pacemaker, uma trombose que a marcara e tantas outras iguais de dor e e sofrimento, que culminariam numa infecção dolorosa de uma bactéria multi-resistente de que sairia milagrosamente sobrevivente.

Viu-se arrancada à vida e ao lar que amava, quando a situação conjugal lhe atentava contra a vida, a que o filho se vira obrigado a resgatar, na cobrança da equidistância filial até então, dando mote às vozes dos que tudo falam e julgam, mas nada sabem e em tudo erram por ignorância e má-fé.

Conheceu naquela que tomara como filha com o filho, a rejeição última que a condenara como outros iguais àquela, a um sofrimento que a infâmia haveria de cobrar, quais hienas acossando injusta e vilmente a vítima enfraquecida, remetendo-a ao ostracismo que lhe tomaria muitas das forças que já lhe faltavam.

Fez-lhe o destino a má surpresa de vir a despedir-se do marido de quem fora obrigada a apartar-se, agora numa última despedida a três com o filho, enquanto aquele a via na derradeira visita, antes de partir sofrendo desta vida.

Fizeram os homens, que passasse os últimos anos de vida repartida, primeiro entre a casa onde se instalara em repouso, nos cuidados do filho que amava e a quem Ela emprestava o chamar de "anjo da guarda" no trato, e depois no lar que este a insistira acolher, para aí descansar digna e condignamente nos tratos cuidados e onde viria a partir desta vida nos braços daqule que a não abandonara num amor incondicional para a procurar proteger de tudo e de todos, e que Ela juntara ao pai e avô deste, nas duas pessoas que mais a haviam amado desde sempre.

Nasceu no dia de Natal que lhe traçou o nome e à semelhança de Cristo, acabou crucificada pelo sofrimento e pela maldade de muitos a quem a dignidade se mostrou alheia, mas que a Ela lhe fora sempre conhecida.
Pobre Mulher que sem razão, sofreu à mãos de uma vida que lhe teimou em dizer "não".
Chamava-se "Natalina", era a minha Mãe e faleceu nos meus braços, num último beijo solitário, ao som das lágrimas que ainda choro.
Foi com Ela que a minha vida começou enquanto a sua só terminará com o final da minha.

Querida mãezinha, repousa lá no céu eternamente, enquanto maldigo os que te fizeram sofrer, transportando nas minhas, as tuas lágrimas de um choro que não pára e as minhas mãos se cerram de dor e de revolta pelo quanto sofreste vã e vilmente, qual leão antes de se lançar sobre as hienas malditas que te acossaram.

A tua, poderia ser a história de uma santa qualquer, à semelhança da Santa Filomena que tanto admiravas pelo sofrimento que lhe reconhecias por devoção. Mas não conhecendo tu o altar dos santos, conheces o altar em que te guardo no meu coração.

Que não se atreva a terra a corromper o teu corpo, que não faça o destino na morte o que os homens não souberam fazer em vida à tua alma. E quando eu partir deste mundo, leva-me de mão dada para os que te quiseram bem para que te possa ver e adorar de novo.
Beijo as mãos num "Muito Obrigado" aos que estiveram do meu lado na última estapa da vida de minha Mãe, quando outros lá não estiveram nos momentos mais difíceis, que só a presença sabe descrever:
  • Prof. Dr. Gorjão Clara (Dir. do Serviço de Medicina II do Hospital Pulido Valente), a quem minha Mãe deveu a vida várias vezes;
  • Dra. Teresa Fonseca (Dra. do Serviço de Medicina II do Hospital Pulido Valente), a quem minha Mãe deveu a vida várias vezes;
  • Dra. Glória Silva (Dra. do Serviço de Medicina II do Hospital Pulido Valente), a quem minha Mãe deveu a vida várias vezes;
  • Corpo clínico do Serviço de Medicina II do Hospital Pulido Valente (médicos, enfermeiros, técnicos e pessoal auxiliar), a quem minha Mãe deveu a vida várias vezes;
  • Corpo clínico do Serviço de Cardiologia e de Pneumologia do Hospital Pulido Valente (médicos em especial o Dr. Nuno Lousada, enfermeiros, técnicos e pessoal auxiliar) pela preciosa assistência que repetidas vezes foi determinante na vida de minha Mãe;
  • Santa Casa da Misericórdia da Venda do Pinheiro e terceiros a pedido desta, com quem tenho uma dívida eterna nos preciosos a atentos cuidados prestados diariamente à minha Mãe;
  • Lar da Santa Casa da Misericórdia da Malveira, onde a minha Mãe foi acolhida com a dignidade que todos os idosos merecem e que se tornou assim, uma extensão da minha própria casa, num cuidado constante que igualmente procurei dar;
  • Aos Amigos que me deram o apoio anónimo em momentos que precisei deles, incluindo em termos logísticos quando foi necessário;
  • Ao meu cunhado que contra-corrente dos demais, se afirmou pela confiança em mim;
  • À Maat e à Maria do Céu pelo cuidado e homenagem prestada nos últimos momentos de vida de minha Mãe;
  • Àqueles que sob o símbolo da Acácia foram fraternalmente preciosos no momento mais doloroso;
  • À minha tia Julieta e primos, que sempre estiveram do meu lado e foram justos no discernimento;
  • Ao Sr. João e Dna. Emília através de quem foi possível alojar a minha Mãe com o conforto desejado.
  • ... e aos demais que a memória, por lapso aqui não inscreveu mas que estiveram também.